lençol eletromagnético... Magia, ilusão ou marketing?
Estive lendo alguns tópicos interessantes que levantaram muitas discussões em relação as redes sem fio. O que me motivou a escrita foi o fato de tentar utilizar meu conhecimento para esclarecer alguns pontos. Quero afirmar também que respeito muito o Professor Gilvan Enriconi, mas devo confessar que algumas de suas afirmações "insultaram" a minha inteligência (até que me provem o contrário). Pretendo sim estar presente em um dos cursos do Sr. Gilvan, pois com certeza tenho muito o que aprender. A idéia deste texto é contribuir de alguma forma para a construção do conhecimento de cada um dos leitores.
Antes de mais nada, gostaria de colocar algumas afirmações que considero importantes (novamente, até que me provem o contrário):
1- Não existe mágica. Existe ilusão;
2- Interferência existe e pode ser vista (sim, podemos ver com experimentos utilizando luz visível) http://en.wikipedia.org/wiki/Interference_(wave_propagation);
3- Devemos separar conhecimentos de RF (antenas, acoplamento, ondas eletromagnéticas...) de transmissão de dados (protocolos, camada de enlace...);
4- Não precisamos saber de tudo, só precisamos saber onde encontrar a informação;
5- Lençol, cobertor, edredon eletromagnético não existe e não faz sentido, pelo menos em redes Wlan (vai ser explicado);
6- Não devemos confundir e comparar diferentes tecnologias (telefonia celular com WiFi por exemplo);
7- Colocar garrafas pet com água em cima do "contador" não irá reduzir sua conta de luz (hehehe);
8- Teoria é importante e vem a complementar e/ou explicar o que vemos na prática;
9- Tudo depende do ponto de vista;
10 - Nem tudo que reluz é ouro;
11- Ninguém é dono da verdade.
Tentarei ao máximo utilizar de exemplos simples afim de facilitar o entendimento e não dificultar, apesar dos assuntos abordados neste texto terem uma carga teórica bastante complexa. Aqueles que buscam um aprofundamento maior em relação a cada assunto, sugiro que o façam. Prefiro reduzir o assunto a sua forma mais rudimentar possível, porém suficiente para esclarecer muitas dúvidas.
Vamos esclarecer a sopa de letrinhas, com textos simples:
1- STUB: Pedaço de cabo utilizado para acoplamento de antena (maximizar a transferência de potência entre o rádio e a antena);
2- CAVIDADE RESSONANTE: Um filtro de sintonia que substitui o famoso LC (capacitor, indutor) para altas frequências;
3- INTERFERÔMETRO: Um parafuso dentro da cavidade ressonante utilizado para mudar a sintonia da antena; Sim, apenas isso. A mágica do interferômetro é o fato de mudar a sintonia da antena atenuando as frequências fora da sintonia. E é aqui que temos a ilusão de eliminar a interferência. Neste caso, o sinal de interferência é menor do que o sinal desejado. Logo, vamos atenuando ambos os sinais até ficar somente com o sinal desejado. Sim, o SNR permanece o mesmo... Se o sinal da interferência for maior ou igual ao sinal que queremos, aí não tem jeito.
Bom, mas para que serve tudo isso? A resposta simplificada seria: Para evitar perdas de energia. Sim, bem simples.
Através do stub fazemos um acoplamento entre o rádio e a antena maximizando a transferência de energia do rádio para antena (apesar de ser comprovado matematicamente que para nossa aplicação, não representa um ganho muito significativo: https://under-linux.org/attachments/...a_paranoia.pdf. A cavidade ressonante corretamente sintonizada serve para maximizar a eficiência da antena, sintonizando o canal desejado.
Logo, tudo isso serve para evitar perdas de energia. Ou seja, tentar enviar para o ar o máximo de energia possível, sem perdas (ou melhor ainda, com poucas perdas). E também é claro ajuda a evitar gastos desnecessários com antenas de maior ganho por exemplo...
Em relação a transmissão de dados, temos que ressaltar os seguintes pontos:
1- SNR: Relação sinal ruído (o sinal que realmente é aproveitado);
2- RUÍDO: Qualquer sinal recebido que não diz respeito ao sinal desejado;
3- NÍVEL DE SENSIBILIDADE: O mínimo de sinal necessário para o rádio começar a "entender" a mensagem;
4- SATURAÇÃO: Nível máximo de sinal aceito pelo rádio para continuar "entendendo" a mensagem.
Para explicar melhor estes termos com exemplos práticos, vamos levar em consideração que estamos em uma sala de aula.
Digamos que todos os alunos estão ouvindo seu professor e entendendo tudo perfeitamente. Ou seja, todos os alunos estão recebendo um sinal acima de seu NÍVEL DE SENSIBILIDADE.
Pergunto: Se o professor falar mais alto, isso implicaria em um melhor entendimento dos alunos? Claramente a resposta é não.
Fazer o professor falar mais alto do que o necessário seria um desperdício de energia. Mas além disso, se o professor falar alto demais, começará a interferir na sala de aula ao lado. Ou seja, a sala de aula ao lado estaria recebendo um RUÍDO.
Logo, para que serve aumentar a potência de um equipamento além do necessário?
Outra pergunta: O fato de um aluno que está sentado perto do professor ouvir mais alto do que outro aluno sentado distante do professor, afeta o entendimento geral da turma? Outra vez a resposta é não. Portanto, não faz o menor sentido afirmar que todos os alunos devem ouvir o professor no mesmo volume... Ou seja, os alunos que estão perto não precisam usar um tapa ouvido. A não ser é claro que eles estejam recebendo a um volume extremamente irritante (mas isso é outra história).
Para explicar a saturação o melhor exemplo que tenho em mente é o da caixa de som. O que acontece quando aumentamos o volume de rádio para um nível no qual a caixa não consegue mais "aguentar"? O som fica distorcido, com a caixa de som "roncando". Neste ponto passamos chegamos a SATURAÇÃO, enviando um nível de sinal que a caixa de som consegue lidar.
Em um mundo ideal, os professores falariam em um tom aceitável para todos os alunos e que não fosse incômodo para as outras salas de aula. Mas como existem pessoas que querem sempre falar mais alto...
Na transmissão de dados é muito parecido. Todo equipamento possui um nível de sensibilidade (que varia de acordo com a velocidade de transmissão) e um nível de saturação de sinal. Somente um detalhe a ser ressaltado: Para garantir um comunicação eficiente, o valor de nível de sinal deve estar usualmente em torno 15db acima do nível de sensibilidade do rádio (ou acima do nível de ruído captado pelo rádio). Este sinal a mais é necessário para evitar a queda da conexão devido a perdas de sinal causadas por condições climáticas e outros fatores.
Para a próxima pergunta, vamos criar um cenário real. Temos um enlace de 5 Km entre dois rádios de mesmas características. Queremos que este enlace opere em 11Mbps (802.11b). Digamos que a sensibilidade do rádio seja de -86dBm. Como precisamos de um sinal de 15db acima, temos que nossos equipamentos precisam receber -71dBm de sinal. Neste cálculo consideramos o nível de ruído como nulo.
Pergunta: Se o nível de sinal aumentar para -50dBm ou cair para -75dBm, vai fazer alguma diferença? Novamente NÃO.
A transmissão de dados não será mais eficiente ou menos eficiente. O equipamento ainda vai estar operando a 11Mbps normalmente.
Se este mesmo exemplo fosse aplicado para um sistema multiponto onde temos um AP e dois clientes. Um dos clientes está recebendo um nível de sinal de -71dBm e outro cliente está recebendo -50dBm.
Outra pergunta: Vai fazer alguma diferença se um dos clientes está com sinal mais forte? Absolutamente NÃO.
Logo, não se iludam com a idéia de lençol eletromagnético sendo criado com todos os clientes tendo o mesmo sinal... Isso não existe. O pior é querer afirmar que deixando os clientes com mesmo sinal fará com que o AP acredite que todos eles estão a mesma distância! Desculpe, mas isso é piada. E podemos provar isso facilmente na prática através do ajuste do ACK timeout em links de 5.8Ghz por exemplo. Experimente deixar o mesmo valor de ACK para um cliente a 500 metros e outro a 4 Km, e claro, deixando os dois com o mesmo sinal (atenuando o sinal daquele cliente a 500 metros).
Aqui vão as dicas para atenuar o sinal do cliente:
- Através do "desalinhamento" da antena;
- Colocando uma antena de menor ganho;
- Através do interferômetro;
- Através de um atenuador de sinal;
Pergunta: Quem aqui acredita que diminuindo o nível de sinal do cliente que está a 500 metros alterará a velocidade de propagação do sinal do AP até este cliente, sendo similar ao tempo que o sinal levaria para chegar ao cliente que está a 4 km?
O que existe e faria diferença em desempenho, seria no caso de algum dos clientes estarem recebendo um nível de sinal baixo, de -87dBm por exemplo. Considerando a sensibilidade do rádio como -92dBm a 1Mbps, este cliente não teria condições de trafegar em 11Mbps (sensibilidade de -86dBm) e aí sim afetaria o desempenho da rede, pois este cliente estaria operando a 1Mbps.
Em um mundo ideal, os provedores teriam seus POP mais condensados e com níveis de potência adequados para uma transmissão eficiente. Mas alguns querem conquistar o mundo e colocar uma Omni com amplificador de 10Watts para cobrir 50Km de raio e pendurar 200 clientes em apenas um rádio... (Sem exageros... hehehe).
CONTINUA...
O 802.11x e seus misterios...
GuileW,
Estudando um pouco o protocolo 802.11x eu notei que aumentar a performance da rede está diretamente associada a velocidade que foi estabelecida na camada de enlace (MAC). Ops, pode deixar que não deixei de pensar nas outras coisas relacionadas a isto, isto foi só relativo ao desempenho do 802.11x ok.
O quadro 802.11x possui 2.346 bytes sendo que destes 2.312 bytes (~18500 bits) é o tamanho do payload que é onde os dados vão guardados. O pacote em si chega a ter no total 18.768 bits.
De acordo com o protocolo e dependendo do rádio e distancia que estamos usando, podemos ter taxas de transmissão por volta de 5 Mbps, quando estabelecemos o enlace do cliente a antena do pop.
Tomando como base que temos uma taxa de 5 Mbps estabelecida entre um cliente e o pop, e um cliente que contratou uma banda de 1 Mbps, o 802.11x irá montar algo como 56 quadros para transmitir essa banda.
Como o quadro possui 18.768 bits os 56 quadros irão totalizar 1.051.000 bits. Se a taxa do enlace é de 5 Mbps para transmitir o 1 Mbps do cliente vamos tomar aproximadamente o tempo de 1/5 do segundo para transmitir os 56 quadros do 1 Mbps, ou seja, 200 ms.
Sendo assim e imaginando que não ocorrerão colisões na transmissão um cliente com a banda de 1 Mbps irá levar o tempo de 200 ms para transmitir um pacote e assim, estimando um tempo de processamento de 2 ms no rádio podemos ter no mesmo rádio 5 clientes de 1 Mbps pendurados simultaneamente.
Tomando estes cálculos como premissa o segredo é estabelecer para um mesmo rádio enlaces com no mínimo de 10 Mbps para os clientes e com isso a capacidade de clientes simultâneos cresce para 10 clientes.
Se utilizar o 802.11g e conseguir estabelecer enlaces de 24 ou 36 Mbps entre cliente e pop (camada física do 802.11x) o número de clientes simultâneos de 1 Mbps sobe para algo como 20 ou 30 clientes respectivamente. O tempo de transmissão do pacote de 1 Mbps no caso do enlace de 24 Mbps fica em torno de 46 ms (0,046 s).
Conclusão, quanto maior a capacidade do enlace estabelecido na camada física do 802.11x, maior o número de clientes que podem ser pendurados no mesmo rádio.
Se um determinado provedor conseguir estabelecer todos os enlaces dos clientes remotos na maior velocidade possível e igualar a todos isto melhora a performance de resposta do AP (POP) aos pedidos dos clientes.
Este pensamento está baseado no principio de que o rádio somente fará o encapsulamento/desencapsulamento do protocolo 802.11x e o processamento de controle de banda, nat, roteamente, etc. estará a cargo de outro circuito ou parte do circuito.
Agora falta tambem estudar matematicamente e estatisticamente a relação de clientes ligados a um determinado POP para poder estimar a capacidade de clientes apontados para o mesmo.
Resumindo: É complicado mesmo.
Abraços,